ENTREVISTA RUI MOTTY - ÓPTICAPRO

ENTREVISTA RUI MOTTY - ÓPTICAPRO

16
MAR
2021

Em que consiste a mais recente novidade da Optocentro ligada ao segmento de luxo?
O objetivo principal que queremos implementar neste gabinete não é segmentar o luxo, porque estrategicamente a nossa empresa nunca se quis posicionar aí. Nós posicionamo-nos no segmento de serviço, em consequência disso acabamos por ter clientes a montante e a jusante. O facto de termos um grupo de clientes que nos obriga a criar um circuito mais privado e exclusivo dentro da empresa, levou a que face ao estado atual dos consumidores e das restrições que temos, criássemos um espaço mais exclusivo, mais limitado no seu acesso. O conceito principal pretende eleger a relação que temos com o cliente, pelo que podemos ser nós a encaminhar as pessoas para este gabinete. O cliente não tem necessariamente que ser alguém que compre caro, mas que queremos premiar com a distinção da diferenciação. Daí a decoração. O cuidado na imagem do espaço é uma tentativa de criarmos um segmento e um serviço diferente

Quando abrirá este espaço ao público?
Sou por natureza um irrequieto, embora tenha a aparência de uma pessoa moderada e bastante calma. Antes de isto estar finalizado, já estou a utilizar o equipamento e a área como de atendimento. É importante que os clientes partilhem da evolução dos processos nas organizações, tornando-os cúmplices e tornando a nossa relação mais profunda e intemporal.

Que marcas estarão associadas a este espaço?
As clássicas, nem precisamos de pensar muito. São marcas como a Cartier, Lindberg ou Silhouette. Segmentos que, pela inovação tecnológica ou pelos materiais raros utilizados, mereçam esta diferenciação. Vamos aqui tentar criar o ambiente propício para uma compra mais calma, escolha mais exclusiva e que permita de certo modo criar confiança a esses clientes.

O novo espaço obrigou a uma redefinição de logística na Optocentro?
Sendo o trabalhador mais antigo nesta organização, acabo por não ter um espaço
fixo para trabalhar. Depois da última entrevista que dei à ÓpticaPro, adquirimos o andar de cima, onde estou a usar uma mesa de reuniões para trabalhar. Usamos esse espaço para formação e reuniões. Foi uma oportunidade que surgiu; um espaço com 300 m2, com consultórios em metade da área e também parte de lazer e refeitório dos nossos colaboradores, para além de um armazém.
 
O espaço já se tornava pequeno?
Curiosamente, o espaço é sempre pequeno. A vida das pessoas tem esta vertente: vamos acumulando e acrescentando e acabamos por sentir que a gestão do espaço é um fator determinante nas organizações e nomeadamente em Lisboa, pelo preço por m2. Melhorou imenso a nossa logística, dado que abdicámos de um escritório aqui a 100 metros e acabámos por centralizar neste edifício todos os serviços.

Na última entrevista (em novembro de 2018), revelou que ainda faltava muito até conseguir impor a sua impressão digital na Optocentro. Dois anos depois, o que mudou?
O mundo avança e vamos continuar a encontrar e transpor barreiras ao longo do tempo. De facto, este trabalho é contínuo, não há hipótese de afirmar que o trabalho já está todo feito e não é preciso fazer mais. É como uma relação entre um casal: é preciso alimentá-la do ponto de vista emocional. A relação interpessoal nas empresas é um foco de tensões emocionais. A manutenção de uma liderança passa por estabelecer o equilíbrio nesse ambiento ao longo do tempo. É uma aprendizagem constante. Para que fique a nossa impressão digital, não apenas na organização, mas também no mundo, é preciso muito alimento, e principalmente numa vertente imaterial. Mas sente-se orgulhoso pelos mais de 30 anos ao leme da Optocentro, ou é uma pessoa permanentemente insatisfeita? Na ambição do Homem constam vários níveis de conquista que terminam após a sua concretização. A necessidade, a sociedade, o mundo e o ritmo a que vivemos assim o obriga, levam a que os desafios sejam constantes e os novos projetos vão aparecendo. A ambição é continuar a procurar sempre o caminho mais adequado. Eu não acredito que com 57 anos, e numa empresa com 35 anos, esteja tudo feito, até porque os hábitos de consumo mudam, as expectativas, até mesmo os produtos, com novas tecnologias. É impossível dizer que a nossa ambição terminou. A ambição para mim não passa pelo conforto material, mas por deixar a tal impressão digital que deriva da imagem que os outros têm de nós e do nosso trabalho.

Quais os novos projetos idealizados, novas ambições? O que lhe falta fazer?
Eu tenho uma noção de serviço que nem eu consigo materializar. Por mais que se olhem para as organizações e as definam por terem um bom serviço, médio ou alto, penso que todos nós não conseguimos colocar no terreno a verdadeira aceção do serviço. Na Optocentro acredito que temos muito por fazer ainda para atingir uma otimização do serviço. O conceito é este: um cliente vê uns óculos e pensa na Optocentro. Fala-se em visão e pensam em nós, ou num dos nossos profissionais. Todos nós temos de trabalhar muito estas ferramentas para conseguir chegar à otimização, muito para além da questão técnica.
 
Isso vai de encontro ao que referiu também na última entrevista que deu à nossa revista: "o fator diferenciador da Optocentro é o alto nível de qualidade com transparência e honestidade" Considera que é este o seu maior cunho na empresa?
A nossa impressão digital, enquanto pessoas com um caráter forte, não é orientada apenas para uma determinada área. Termos que pensar na imagem da empresa, nos seus valores, circunscritos para valores que se podem extrapolar para a sociedade, adquiridos através da família e educação. Motivo de orgulho é, no estado de pandemia em que estamos, termos o nosso espaço composto por clientes. Tentamos fidelizar o cliente não com um espírito mercantilista puro, mas com um sentimento de valor acrescentado transposto para o cliente na venda. Esse é um factor importante para a manutenção do nosso equilíbrio como empresa.

Como têm sido estes tempos de pandemia para a Optocentro?
Não passámos à margem, como é natural. Sofremos como todos, teve um impacto global, mas sempre tive uma certeza desde o início: mantive sempre a convicção de que estaríamos sempre abertos, a prestar serviços presencial ou remotamente. Tive sempre a certeza que, ainda muito tradicional, ligado à confiança das duas áreas em que nos movimentamos bem - comércio e saúde -, todo o processo de retoma tivesse mais consistência que outras áreas do retalho. A óptica hoje, na sua generalidade, está muito melhor que a maioria dos outros retalhos, por ser uma necessidade. Outras empresas com valores idênticos, conseguiram sofrer menos com este impacto negativo.

Na sua opinião, o que vai mudar com o fim da pandemia?
Nunca mais vamos voltar a trabalhar como antigamente. Há aqui uma variável: todos nós passamos a ter consciência que a interrupção do circuito da vida pode acontecer com mais facilidade do que imaginávamos. Veja-se o que aconteceu. Desconhecemos o desemprego no próximo ano, a economia não é uma ciência exata e a falta de trabalho será um elo importante para definir a evolução económica de 2021.

Quais as suas expectativas?
Por estranho que pareça, estou sempre imbuído de um certo otimismo, embora no fundo todos nós tenhamos receio, porque o futuro é mais desconhecido. Este é um mal comum e precisamos de soluções comuns. O limite seria a rutura de toda a sociedade e isso não acontecerá de certeza. O mais importante é tentarmos acarinhar os nossos clientes; é a altura para continuarmos a olhar para os clientes de maneira diferente.

Como está o programa "Partilhar Visão"?
O programa irá continuar numa segunda fase. Os objetivos que atingimos não foram nem de perto nem de longe os que queríamos ter atingido, mas continuamos a bater a portas para atingir os resultados que ambicionamos. Estas decisões do Governo não são fáceis, há setores muito mais complicados que o nosso e este programa irá continuar nos próximos tempos.

Em 2018 afirmou que "por vezes temos decisões que nem sempre são voluntárias, algumas são experiências que temos de pôr à prova e em que podemos ter de recuar e seguir por outro caminho, se necessário". Acaba por ser um reflexo da história de amor dos seus pais, um casal de origens totalmente diferentes que lutou pela sua relação um pouco contra tudo e todos após se terem conhecido em Portugal?
O instinto leva-nos a tomar decisões desse género. Se dominássemos o futuro, éramos muito mais pragmáticos e resultaria tudo muito mais rapidamente. Por vezes, temos que admitir o erro e procurar alternativas para encontrar soluções. O importante é recolher experiência do trilhar desses caminhos.
 
Em tempos disse que "já conhecia Portugal mesmo antes de chegar", através da sua avó e da sua mãe. Como assim?
A minha avó e a minha mãe são alfacinhas de gema e as histórias que fui ouvindo tinham sempre a ver com Lisboa e Portugal, criando um imaginário na minha cabeça. A realidade não correspondeu às minhas expectativas, até porque Portugal estava num processo de transformação nessa altura, com a saída do Estado Novo, para uma liberdade ainda desconhecida. A vivência da escola foi o que me concentrou mais a atenção.

Foi bem ou mal recebido na escola?
Portugal é um país racista, não vamos pintar a tela. Um racismo que corre por
baixo da alcatifa e este comportamento não é frontal, pois não seria politicamente correto. Temos todos brandos costumes. Sou um privilegiado porque a minha aprendizagem de vida decorreu com a família da parte da minha mãe, ditos brancos, e provavelmente por essa razão tarde tive a consciência que não seria "branco". A verdade é que nunca senti frontalmente um comportamento racista para comigo. Mas algumas barreiras é certo que existiam. Aliás, eu fiz da minha diferença uma arma de arremesso. Quer o apelido quer a fisionomia acabaram por ser o privilégio da diferença. No fundo, temos de saber fazer das nossas aparentes fraquezas os nossos trunfos.

Sente-se mais português ou moçambicano?
Por mais que tenha raízes profundas africanas, sou mais português, com uma componente híbrida mental, por ter aprendido a ver o mundo de um prisma diferente, fora de um determinado segmento. Hoje, mais do que nunca, nós conseguimos ter a noção do país que somos, daquilo que parece não acontecer, mas tenho de afirmar que temos muito que aprender com estes novos movimentos que estão a surgir, como o "Black Lives Matter". 
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